31 julho 2007

Desmontando e reconstruindo a ideia de lusofonia

Excerto da intervenção de Mia Couto na conferência internacional promovida pela RTP sobre "O Serviço Público de Rádio e Televisão no Contexto Internacional: A Experiência Portuguesa". O texto de onde retirei esta citação é da responsabilidade do semanário Savana, de Maputo, e pode ser lido aqui.


(...)
«Quando a lusofonia foi proclamada como um projecto supranacional houve interrogações que foram levantadas. Eu mesmo questionei o sentido desse projecto numa realidade plural em que parte dos seus cidadãos não fala português ou fala português como segunda língua. Evidentemente que eu me posicionava tendo, sobretudo, em conta a realidade do meu país. Não seria justo inventarmos um patamar de cidadania que excluía, à partida, mais de metade dos moçambicanos. A verdade é esta: apenas uma das nações de Moçambique já vive na lusofonia. Apenas parte dos moçambicanos já se reconhecem como falando e sendo falados pela língua portuguesa. Mas também é verdade que toda a grande nação moçambicana encontra no português a sua língua de construção, o idioma que a projecta num corpo unitário e que a torna capaz de viver na modernidade.

(...)
O lugar e o papel da língua portuguesa como idioma oficial em Moçambique foram debatidos, em 1962, no primeiro congresso da Frente de Libertação de Moçambique realizado na clandestinidade perto de Dar-es-Salaam. A maior parte das actas -- incluindo a decisão de adoptar o português como língua oficial -- foram redigidas em inglês. Os quadros com maior formação escolar tinham estudado nos países vizinhos. O português foi adoptado não como uma herança mas como talvez a mais valiosa ferramenta para forjar a unidade da futura nação. Se a adopção do português foi um acto de soberania, já a criação da lusofonia não resultou de iniciativa própria de Moçambique. O projecto lusófono surgiu, afinal, pouco tempo depois daquilo que em Portugal se chamou de "descolonização". Detenho-me na palavra "descolonização" porque ela é um exemplo claro de divergentes modos de ler o passado. O termo "descolonização" é emblemático do que Bernard Shaw disse do inglês: podemos ter uma língua comum para melhor nos desentendermos. Ainda hoje, para muitos portugueses, o que aconteceu em África foi que Portugal, com o 25 de Abril, aceitou, enfim, descolonizar, os territórios africanos. Ora, parece a nós, africanos, que é preciso acertar o sujeito do verbo. Não foi Portugal que descolonizou os países africanos. A descolonização só pode ser feita pelos próprios colonizados. E nós, todos nós, sem excepção, éramos colonizados. Descolonizámo-nos uns aos outros, uns e outros. Parece um detalhe, coisa de uma simples palavra. E as palavras traduzem modos de pensar. E esse passado que nos feriu a todos não pode ser superado apenas com apelos ao esquecimento. Não é de esquecer o passado que necessitamos. Mas de o entender. De qualquer modo, para Moçambique, o projecto da lusofonia surgiu pouco depois da ruptura colonial. Era natural que houvessem dúvidas. E parecia óbvio que os países africanos não se podiam reclamar da lusofonia do mesmo modo dos portugueses e brasileiros. A maior parte dos africanos ama as suas outras línguas maternas e esperava (e ainda espera) que esses idiomas não sejam votados ao esquecimento ou arrumados naquilo que se chama o património tradicional. Estamos, pois, perante um processo que necessitou de vencer inércias e superar desconfianças. A falta de confiança, porém, não estava reservada apenas à antiga potência colonizadora. Havia suspeições de parte a parte. Vale a pena recordar aqui uma espécie de "tesourinho deprimente" da nossa história recente. Todos nos lembramos como certos sectores da política portuguesa entraram em pânico com a adesão de Moçambique à Commonwealth. O que se passava? Os moçambicanos haviam traído a sua fidelidade ao idioma luso? As reacções de algumas facções foram de tal modo excessivas que só podiam ser explicadas por um sentimento de perda de um antigo império. A exemplo da síndrome do marido traído que, não reconhecendo autonomia e maioridade na ex-mulher, sempre se pergunta: com quem é que ela anda agora?

(...)
Na realidade, as autoridades moçambicanas não mudaram a sua política linguística e o português permaneceu na sua condição de língua oficial e unificadora. Fala-se hoje mais português em Moçambique que se falava na altura da Independência. O Governo moçambicano fez mais pela língua portuguesa que séculos de colonização. Mas não o fez por causa de um projecto chamado "lusofonia". Nem o fez para demonstrar nada aos outros ou para lançar culpas ao antigo colonizador. Fê-lo pelo seu próprio interesse nacional, pela defesa da coesão interna, pela construção da sua própria interioridade. Há poucos dias a televisão moçambicana contou a história de dois jovens aliciados na província de Nampula para virem trabalhar em Maputo. Era um triste exemplo das novas redes de trabalho escravo. Os jovens foram, sem o saber, transferidos para a Suazilândia onde foram mantidos numa espécie de cativeiro. Os contactos com a gente local estavam limitados: os jovens falavam apenas a sua língua (e-makua) e não entendiam uma palavra de seswati. Até que um dia, junto ao rio onde lavavam roupa, escutaram um grupo de jovens falando em português. Foi então que entenderam onde estavam e, ali mesmo em português, planearam a sua fuga para Moçambique. Este episódio parece isolado e circunstancial, mas ele traduz o quanto a língua portuguesa nos serve como cartão de identidade numa realidade linguística tão dispersa e fragmentada. Esta é a ironia da História e do modo como ela baralha os destinos: sabemos quem somos e onde estamos por via de um idioma que, antes, parecia ser dos outros e vinha de fora.

(...)
Temos um modo estranho de lidar com a realidade, como se o real fosse um contrabando a transportar para territórios que não são nossos. Um dos territórios a que nos habituamos que não fosse nunca nosso é o futuro. Os outros, de outras línguas, parecem sentir-se mais à vontade nesse lado de lá do tempo. Tanto nos disseram que éramos pequenos para ter presente que acabamos por encarar o futuro com suspeição. Contentamo-nos com viver de desbotadas memórias de um passado longínquo: É verdade que não podemos criar história fora do passado. Mas não podemos é fazer do passado a nossa História. Falo da dificuldade de nos projectarmos no Tempo porque aquilo que nos traz aqui hoje -- a lusofonia -- existe no futuro para ser pensado ontem e produzido hoje. A lusofonia é algo estranho, pois é um ser que existe para nascer. A lusofonia é qualquer coisa que é já nosso, mas que parece ainda não nos pertencer a todos por igual. De uma criatura assim seria mais fácil dizer mal e lançar suspeições. O projecto da lusofonia tem essa enorme desvantagem de ser preciso fazer qualquer coisa e de nos empurrar para fora desse invisível muro onde descansamos existências e lançamos culpas sobre os outros.

(...) será no que fizermos que nos converteremos realmente numa comunidade capaz de propor discursos inovadores e introduzir mudanças. Dizemos que a língua portuguesa não é apenas dos portugueses. E acreditamos que isso seja a manifestação de uma intenção política, de uma vontade adoptada. Mas não se trata de intenção ou vontade. Trata-se de uma questão histórica: há séculos que a língua portuguesa é também africana. O que seria do idioma português se não tivesse beneficiado das contribuições linguísticas dos árabes que ocuparam e viveram na Península Ibérica? Esses árabes ajudaram a tecer este grande tapete onde se deitam as nossas almas. Esses árabes são africanos, tanto como nós, os que habitamos mais a Sul. Há séculos que o idioma lusitano é um filho mestiço de namoros feitos entre as duas margens do Mediterrâneo.

E mesmo se nos quisermos abster à influência das línguas bantus nascidas depois do tempo das caravelas: há quanto tempo palavras como minhoca, cambada e candonga e tantas outras se instalaram na língua portuguesa? Pois eu vos digo, tomando apenas um exemplo: a palavra minhoca instalou-se no século XVI e hoje a maior parte dos portugueses nem sequer suspeita da sua origem longínqua. Meus amigos, a verdade é a seguinte: a lusofonia não começou hoje. A nossa língua comum foi construída por laços antigos, tão antigos que por vezes lhes perdemos o rasto. De uma vez por todas, superemos receios e fantasmas. De uma vez por todas namoremos o futuro para que ele se enamore de nós.»

Mia Couto, escritor moçambicano.

25 julho 2007

Mezinhas e rezas da tradição portuguesa


Uma canga ou jugo de Matosinhos (Foto: Museus na Escola)



Matar piolhos

Faz-se uma mistura de borralha (cinzas quentes) peneirada com petróleo ou laranja azeda. Mexe-se bem e esfrega-se a cabeça com esta pasta.

Aliviar as dores de ouvidos

No ouvido onde se sente a dor deita-se leite de uma mulher que esteja a amamentar.

Matar lombrigas

Dar às crianças, uma vez por mês, leite fervido com um dente de alho.

ou

Tomar uma colher de azeite com açúcar.

Eliminar o treçolho (inflamação na pálpebra)

Esfrega-se o dedo na palma da mão e coloca-se o dedo aquecido em cima do treçolho.

Tratar a papeira

Quando uma criança tem a papeira deve colocar o pescoço na canga do gado, acabado de descangar.

Parar o sangue solto pelo nariz

Colocar dois pauzinhos em cruz nas costas do doente.

Fazer baixar a febre

Coloca-se um pano molhado em água fria na testa do doente.

Eliminar os cravos nas mãos

Sem ninguém ver contam-se os cravos que se tem nas mãos. Depois por cada cravo coloca-se, dentro de um saco, uma areia de sal. Põe-se o saco numa fonte. Os cravos passam para a pessoa que levar o saco.

ou

Promete-se uma dúzia de cravos (flores) a São Bento.

Tratar uma íngua (inflamação nas virilhas)

Com as mãos faz-se rodar uma foice à volta da perna que tem a íngua e vai-se dizendo: «Íngua e forca vai a Roma, íngua e forca ficou». Reza três vezes o "Pai Nosso" e a "Avé Maria".

Eliminar a azia

Tomar uma colher de açúcar ou mastigar um rebento de oliveira.

Tratar impingens (erupções cutâneas)

Com uma mistura de borralha e azeite, unta-se a impinge com uma pena de galinha e diz-se a seguinte reza: «Impinga repinga sai-te daqui, cinza do lar é contra ti. Eu te talho, eu te corto, pela graça de Deus e da Virgem Maria, um Pai Nosso e uma Avé Maria».

Encontrar gado perdido

Vai-se a uma capela ou igreja que tenha a imagem de Nossa Senhora de Fátima e diz-se: «Nossa Senhora aparecida trazei-me o gado que perdi». Rezar 10 vezes a Avé Maria, 10 vezes a Santa Maria, 5 vezes o Pai Nosso e ficar um dia de jejum.

Fazer crescer a massa do pão

Depois de meter o pão no forno e com a porta aberta procede-se do seguinte modo: com a pá do forno faz-se uma cruz na porta e diz-se: «Cresça o pão no forno, a graça de Deus pelo mundo, vivam os lavradores e morram os malfeitores».

Contra o bruxedo / mau olhado

Prepara-se um caco de telha. Dentro colocam-se brasas, alecrim, erva da inveja, palhas alhas, sal virgem e pontas de vassoura de giesta. Defuma-se o animal ou pessoa em cruz e vai-se dizendo: «Deus que te deu, Deus que te criou, Deus que te tire o mau olhado que contigo entrou, pela graça de Deus e da Virgem Maria, reza-se um Pai Nosso e uma Avé Maria». Leva-se o caco a uma encruzilhada de caminhos.

Eliminar sangue pisado

No local do sangue pisado colocam-se várias sanguessugas (número de sanguessugas é de acordo com o tamanho da nódoa). Quando as sanguessugas estiverem cheias caem despegando-se da pele.

ou

Aquecem-se côdeas de pão de milho e amassam-se com vinagre quando estiverem bem quentes. Espalha-se essa pasta no local da nódoa e cobre-se com um pano.

Talhar a erisipela (doença cutânea)

«Pedro e Paulo foram a Roma. Encontraram Nossa Senhora que lhe perguntou: Onde vão? Vamos curar uzipela que muita gente morre dela. Ide e curai-a com sumo de oliva e pena de galinha. Por a graça de Deus e da Virgem Maria um Pai Nosso e uma Avé Maria».

Acalmar as trovoadas

Quando troveja as pessoas costumavam dizer a Santa Bárbara a seguinte reza: «Santa Bárbara Virgem se levantou e no seu livrinho de ouro pegou. O Senhor lhe perguntou: Para onde vais Bárbara? Vou juntar trovoadas que andam pelo mundo espalhadas. Pois Bárbara virgem [vai] e junta-as para onde não haja pão, nem vinho, nem bafo de menino, nem galo a cantar, nem boi a urinar. Pela graça de Deus e da Virgem Maria, reza-se um Pai Nosso e uma Avé Maria».

ou

Lança-se no lume da lareira três raminhos de oliveira benzidos no Domingo de Ramos.

"Deitar" galinhas

Faz-se um ninho de feno. Escolhem-se os ovos que têm de ser frescos e bons. Para ver a galadura do ovo, coloca-se o mesmo contra a luz de uma vela. Colocam-se os ovos no ninho, um a um e vai-se dizendo a seguinte reza: «São Salvador que nasça tudo pitas e um só galador».

ou

«Pito, pitão tudo pitas e um só galão».

(in Património Imaterial Galego-Português)



Uma junta de bois com a sua canga ou jugo (Foto: Coura: Magazine-Foto)

19 julho 2007

Uma jam session virtual

15 julho 2007

O Grupo do Leão, por Columbano


O Grupo do Leão, de Columbano Bordalo Pinheiro, 1885, óleo sobre tela, Museu do Chiado, Lisboa

Este quadro de Columbano retrata um conjunto de personalidades ilustres que, em 1885, frequentavam habitualmente a cervejaria Leão de Ouro, em Lisboa. Clicar na imagem para ampliá-la.

Sentados, da esquerda para a direita: Henrique Pinto, José Malhoa, João Vaz, Silva Porto, António Ramalho, Moura Girão, Rafael Bordalo Pinheiro e José Rodrigues Vieira. De pé, da esquerda para a direita: João Ribeiro Cristino, um dos proprietários da cervejaria, um empregado de mesa chamado Manuel, Columbano Bordalo Pinheiro, outro proprietário do estabelecimento e Cipriano Martins.

13 julho 2007

"Lição para a sociedade civilizada"


(Foto: Eraldo Peres)


LIÇÃO PARA A SOCIEDADE CIVILIZADA

(...) Durante a longa permanência entre os índios, a única contribuição que talvez lhes tenhamos dado, foi mostrar aos civilizados que o índio brasileiro não é um selvagem agressivo e destruidor. Nós trouxemos a notícia de que eles constituem uma sociedade tranqüila, alegre. Ali, ninguém manda em ninguém. O velho é dono da história; o índio, dono da aldeia e a criança, dona do mundo. Nesse tempo todo em que vivemos perto deles, nunca assistimos a uma discussão, a uma desavença na aldeia ou a uma briga de marido e mulher. Se a criança faz alguma coisa que o pai desaprova, ele não a repreende. Apenas a tira de onde está e a leva para outro lugar. É admirável, também, o respeito que os pequenos têm pela natureza, valor que adquirem observando o comportamento dos mais velhos.

O chefe, ou cacique, é o líder cultural da aldeia. Ele goza de muitas prerrogativas, mas deve observar uma série de restrições: não pode falar alto, nem rir ou fazer gestos bruscos, por exemplo. Sua função não é impor regulamentos nem determinar tarefas, mas estabelecer uma ligação entre a comunidade e os pajés que se reúnem todas as tardes para conversar, fumar e deliberar sobre o bom andamento da tribo. O cacique não participa da conversa. Apenas ouve o que está sendo dito e na manhã seguinte, segurando o arco numa das mãos, dirige-se ao povo que se junta diante de sua maloca para escutar as recomendações dos pajés e, em seguida, colocá-las em prática. Supostamente os pajés nunca erram porque não têm outra preocupação além de ficar zelando pelo bem-estar da comunidade. (...)



(Foto: Eraldo Peres)


LAÇOS AFETIVOS

(...) As mães são extremamente carinhosas. As crianças índias não aprendem a engatinhar porque saem do colo materno já podendo caminhar. A menina é criada sempre junto da mãe e o menino, assim que aprende a andar, passa a seguir os passos do pai, observando tudo o que ele faz e tentando imitá-lo porque intui que um dia será um homem com obrigações dentro da aldeia.

Nunca ouvi um indiozinho dizer não para pai e mãe e nem os pais dizerem não para os filhos. Apesar dessa aparente falta de limites, a criança não desenvolve maus comportamentos porque cresce copiando a conduta dos adultos.

As relações conjugais são serenas. Não há brigas entre marido e mulher. Se algum desentendimento surge, a queixa é levada para o pajé e o problema acaba sendo resolvido a contento. O homem pode ter até três mulheres. Se a primeira concordar, ele pode casar-se com a segunda e, se as duas estiverem de acordo, ele pode desposar a terceira. Elas, em geral, não se opõem porque o trabalho da primeira esposa passa a ser realizado pelas outras companheiras. Ela não carrega mais água, não arruma mais a maloca nem se levanta para comer porque é servida na rede. O marido, com um gesto, indica qual das outras duas deve armar a rede debaixo da rede dele. Essa fica responsável por manter o fogo aceso durante a noite toda porque o índio é muito friorento. Fazer o fogo, entretanto, é função do homem. Ele pega uma haste de urucum e a fricciona num pedaço de pau até sair a primeira fumacinha sob o olhar atento do curumim que se põe a soprar e a colocar folhinhas secas para dar força à chama.

A convivência entre os índios é marcada por comportamentos bastante pitorescos. Um homem volta da pesca trazendo uma fieira de peixes. Quando entra no pátio da aldeia, se ouve alguém gritar, registra quem foi porque na hora em que a comida estiver pronta, o primeiro pedaço será oferecido para o índio que gritou. Por isso, ele fica na espreita, escondido, e só corre para casa se não vê ninguém por perto. Sujeitos pouco precavidos, às vezes, têm que reservar quatro ou cinco porções para os companheiros que os viram passar com os peixes. E tudo é feito naturalmente, sorrindo, sem rixas nem desavenças. Pacíficos no interior da aldeia, eles se tornam agressivos quando vêem ameaçada de ocupação uma área importante para sua tribo. A beligerância só se manifesta quando interesses territoriais estão em jogo.

É um mundo diferente, habitado por gente que respeita tradições que o homem civilizado custa a entender. (...)

Orlando Villas Bôas



(Foto: Eraldo Peres)


GLOSSÁRIO

Pajés - pessoas de destaque em uma tribo indígenas. Em muitas tribos são considerados curandeiros, tidos por muitos como portadores de poderes ocultos ou orientadores espirituais. Assim como os Xamãs, podem assumir o papel de médicos, sacerdotes ou fazem o uso de plantas para fins medicinais ou invocação de entidades. Normalmente o conhecimento da utilização da planta correta para cada caso ou situação, é passado de geração em geração, trazendo assim uma responsabilidade para o último Pajé da tribo.

Maloca - grande choça coberta de palmas secas, us. como habitação por várias famílias índias, esp. sul-americanas.

Urucum - arvoreta da família das bixáceas (Bixa orellana), que chega a atingir até 6 metros de altura, nativa na América tropical.

Curumim - palavra de origem tupi que designa, de modo geral, as crianças indígenas.



(Foto: Eraldo Peres)


As imagens são de Eraldo Peres e documentam momentos do kwarup (conjunto de cerimónias fúnebres) realizado em 2003 pelos índios Kuikuro do Alto Xingu, no estado de Mato Grosso, em homenagem ao indigenista brasileiro Orlando Villas Bôas (na foto ao lado), que falecera algum tempo antes.

07 julho 2007

Um Santo António africano

Santo António (Toni Malau), peitoral de latão de autor desconhecido do antigo Reino do Kongo, séc. XVIII, The Metropolitan Museum of Art, Nova Iorque

Santo António foi um santo particularmente venerado no antigo Kongo, por influência de Kimpa Vita, também chamada Dona Beatriz, que viveu no séc. XVIII e fundou um movimento religioso chamado Antonianismo. Kimpa Vita acabou por ser morta na fogueira, acusada de heresia.

02 julho 2007

Abertura "1812", de Tchaikovsky


Infantaria russa do tempo de Napoleão (Imagem: Collectible Toy Soldiers)


O russo Pyotr Ilyitch Tchaikovsky (1840-1893) foi um dos mais proeminentes compositores europeus do período romântico, período este que englobou praticamente todo o séc. XIX e o princípio do séc. XX. Muitas das obras deste compositor são conhecidas e admiradas em todo o mundo, graças às belas melodias que contêm e às sugestivas orquestrações que ele lhes fez. Tchaikovsky é, sobretudo, admirado pelos seus bailados, com particular destaque para "O Lago dos Cisnes", "A Bela Adormecida" e "O Quebra-nozes". No entanto, não podemos esquecer a sua celebrada "Sinfonia Patética", a sua ópera "Eugénio Onegin" ou a sua Sinfonia nº 5.

Igualmente dentro do estilo próprio da época romântica é a sua Abertura "1812", a qual atinge uma apoteose que é verdadeiramente inultrapassável. Esta abertura evoca a invasão da Rússia por Napoleão, ocorrida no ano 1812, e a subsequente derrota das tropas francesas.

A abertura começa por apresentar uma melodia leve e tranquila, que sugere a vida pacífica que os russos teriam naquela época. A partir de certa altura, o ambiente torna-se pesado e angustiado, dando a entender a ameaça que se começa a perfilar no horizonte. Os acordes da "Marselhesa", em tom triunfal, e o fragor dos combates evocam o avanço imparável das tropas francesas. A partir de certa altura, contrapõe-se à "Marselhesa" uma melodia popular russa, a qual sugere a organização da resistência por parte dos russos às tropas invasoras. Dá-se por fim o confronto entre russos e franceses, em que se ouvem tiros de canhão e tudo! Deve ter sido a primeira vez na História em que o canhão foi utilizado como instrumento musical... (Correcção: Antes de Tchaikovsky, já Beethoven tinha incluído tiros de canhão numa sua obra, que é muito pouco executada). No fim da peça, o repicar dos sinos vem juntar-se ao fragor dos tiros de canhão, numa celebração da vitória russa sobre Napoleão.

Feita esta breve e incompleta apresentação da obra, proponho que a ouçamos.

Abertura "1812", de Pyotr Ilyitch Tchaikovsky